“Em 2018, sonhávamos em transformarmo-nos num dos maiores actores de Sofala. Acreditávamos que os nossos ovos estariam na maioria das mesas de Sofala. Procurámos apoios, investimos todas as nossas poupanças neste negócio. E quando pensávamos que já tínhamos alcançado a nossa meta, eis que o inesperado aconteceu. O IDAI, um nome que jamais esqueceremos, chegou e destruiu os nossos sonhos.” Lote Muchanga, proprietário e director-geral da Quinta do Bom Ovo, Beira, Sofala.

Quando, pela primeira vez, visitei a Quinta do Bom Ovo, em 2017, fiquei surpreendida com a dedicação deles em transformarem-se num negócio estável. A quinta apresentava-se cheia de esperança e energia. Os trabalhadores tinham muito para dar. Na época, eles produziam e distribuíam cerca de 5,000 ovos por dia e queriam duplicar a produção. Nessa altura, a Quinta do Bom Ovo tinha uma cadeia de distribuição estabelecida, tendo contratos com 3 lojas locais de vendas a retalho.

Em 2018, a Quinta do Bom Ovo concorreu para os fundos do Fundo para a Expansão de Mercados de Alimentos Nutritivos da GAIN (SMNF), com a intenção de melhorar as suas infraestruturas de produção e investir em equipamento, com vista a aumentar a sua produção diária. A meta deles era chegar aos 20,000 ovos diários, até ao fim de 2019. Eles estavam a caminho dessa meta e nós tínhamos confiança no projecto.

“Em Janeiro de 2019, muito antes de recebermos os fundos da GAIN, decidimos aumentar a produção. Adquirimos mais galinhas poedeiras, na expectativa de produzir cerca de 9,000 ovos por dia,” conta o Sr. Muchanga, acrescentando “estávamos ansiosos. Sabíamos que o mercado compraria os nossos ovos, pois havia poucos produtores na província. Dependemos de outras províncias e das importações.” O compromisso deles era também encorajador para a GAIN investir no sector.

Mas então veio o IDAI. E com ele, toda a região foi devastada. De 14 de Março de 2019 e, durante os dias seguintes, ninguém sabia o que se estava a passar na província e região.

A 21 de Março, uma semana após o ciclone IDAI ter atingido a cidade da Beira e a região central de Moçambique, afectando milhares de pessoas e destruindo inúmeros empreendimentos, conseguimos falar com o Sr. Muchanga, tendo-lhe perguntado sobre o impacto do ciclone na farma.

“Katia,” ele disse o meu nome, do outro lado da linha. Na época, as comunicações eram um desafio e, mesmo assim, a voz quase imperceptível não conseguia disfarçar a frustração, a tristeza e o desespero pelos quais ele atravessava. “Katia, aqui estamos todos bem. Apenas ontem consegui chegar à quinta. Infelizmente, todas as nossas instalações foram destruídas. A Quinta do Bom Ovo já não existe. As nossas galinhas ainda estão lá, perdemos cerca de 350 galinhas, de um total de 9,000. Mas receio que as coisas venham a piorar e somos capazes de ter de vender todas as galinhas, pois há escassez de ração na Beira. Todas as estradas que ligam a província ao resto do país estão cortadas e não sabemos o que acontecerá a seguir,” disse-me ele.

Aquelas eram palavras muito tristes. Eu estava diante duma pessoa que eu sabia que era energética e a quem eu via como um empreendedor de sucesso, mas que estava prestes a desistir dos seus sonhos.

Nos dias e semanas seguintes, discutimos sobre este e outros assuntos ao nível do escritório. Contactámos os nossos colegas nos escritórios globais. Porque acreditávamos nos negócios com os quais estávamos a trabalhar, para aumentar o acesso e disponibilidade a alimentos seguros e nutritivos no país, decidimos que estava na hora de procurar apoios para os ajudar a reconstruir os empreendimentos. Deste modo e, com o apoio do Governo do Reino dos Países Baixo, desenhámos e implementámos o projecto de Recuperação dos Sistemas Alimentares pós-ciclone (RFS). Através deste projecto, identificámos diversos empreendimentos em Sofala, Manica e Cabo Delgado e concedemos-lhes subvenções para a rápida recuperação das operações. Pretendíamos assim contribuir para a rápida restauração dos sistemas alimentares locais, pois também acreditávamos que, através de projectos similares, mais pessoas iriam recuperar os seus empregos.

A Quinta do Bom Ovo foi uma das beneficiárias. Através do nosso apoio, eles reconstruiram as infraestruturas e agora têm edificações mais resilientes a desastres naturais. O primeiro pavilhão por eles construído tem capacidade para 10,000 galinhas poedeiras. Eles estão, também, a construir um segundo pavilhão e espera-se que o mesmo esteja operacional nos princípios de Janeiro de 2021.

“Como sabes, recebemos os primeiros fundos após os eventos de Março. Mas o dinheiro só estava designado para um projecto específico. Assim, era necessário identificar fundos para repor o negócio, nas condições pré-ciclone. Deste modo, concorremos para os fundos de recuperação, que nos ajudaram a reconstruir a quinta,” conta-me o Sr. Muchanga, com os olhos a brilhar. É possível notar que ele restaurou a confiança.

“Não creio em milagres similares. Pensava que aquele fosse o fim do meu negócio. Mas, de repente, conseguimos regressar aos trilhos. Hoje estamos a receber 7,500 galinhas e teremos os nossos ovos no mercado nos próximos dias. Isso acontece na melhor altura, pois a época festiva aproxima-se e iremos contribuir para aumentar o acesso a ovos frescos na cidade,” diz ele.

Como a Quinta do Bom Ovo, onze outros empreendimentos locais de produção de ovos receberam fundos da GAIN, através do SMNF e RFS, a nível nacional.

Presentemente, estima-se que, em média, um Moçambicano consuma somente 10 a 12 ovos, por ano. Muitos países vizinhos têm uma maior taxa de consumo de ovos (o Zimbábue e a África do Sul consomem perto acima de 40 ovos por ano, respectivamente). Por outro lado, é importante mencionar que, do total de ovos consumidos pelos Moçambicanos, apenas 40% são localmente produzidos e os restantes são importados.

Assim, espera-se que, com o aumento do investimento no sector, mais ovos estarão disponíveis no mercado e iremos reduzir a dependência nas importações. Mais ainda, também acreditamos que, com o fortalecimento do sector, todos os intervenientes irão beneficiar-se, desde aqueles que produzem a matéria-prima (tal como a soja e o milho), àqueles que fornecem os pintos e outros insumos.

Compreendemos que ainda há desafios, se quisermos superar esta situação. Deste modo, a GAIN está comprometida em trabalhar com todos os intervenientes, desde as entidades do Governo às associações empresariais locais, bem como os produtores de ovos, com vista a aumentar o seu empenho no desenvolvimento da indústria.

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